Confesso
que ando muito desleixado com a escrita. As idéias passeiam pela minha cabeça,
deixam sementes no coração, mas meus dedos operários estão em protesto sindical.
Sempre encontram alguma distração, outro assunto de relevância ímpar, e todos
os conceitos e teorias que me obsediam, acabam se perdendo.
A
minha concentração não anda das melhores. Seja pelo meu notebook sexagenário
que, sempre que começo um texto, superaquece e desliga sozinho. O Grafite
mordiscando o meu braço e me arranhando
pedindo carinho. Alguma notificação no meu celular que puxam meus olhos
curiosos. Alguma piada sem graça que só eu consigo rir. Ou uma declaração de
amor para minha namorada que não pode esperar o tempo passar. Sempre algum tipo
de contratempo. Seja no trabalho e suas urgências, a barriga roncando ou as
notícias do mundo e dos familiares. Neste exato momento, por exemplo, ouço um
som reclamatório vindo do estômago e o
relógio passando desapercebido pelo meio dia.
E nessa brecha temporal, minha mente viajante começa a captar várias
freqüências de assuntos, desejos e sentidos variados. E... onde eu estava
mesmo?
Ah...
lembrei! Na minha procrastinação e falta de atenção. Como alguém que tem a
fórmula da paz mundial e, do nada, repara que um clip metálico aberto parece um
cockpit de Fórmula 1. E já lembra que se completaram 30 anos do primeiro título
mundial de Ayrton Senna, 35 anos do bicampeonato de Nelson Piquet e que, também
em 1983, o Grêmio foi campeão do mundo e eu dormi com dez minutos de jogo, só
sabendo do resultado da partida quando fui numa fruteira e visualizei a capa do
jornal Zero Hora com o título de capa: "A Terra é Azul".
Aliás,
como um bom dinossauro entre robôs, demoro um pouco pra tentar me adequar e
utilizar as novas tecnologias. Como tenho uma característica extremamente
saudável de falar sozinho, baixei um aplicativo que transforma a voz em texto.
Pensei comigo que meu déficit de atenção e preguiça estariam resolvidos. Mas,
após o segundo teste, quando percebi que, às vezes, o app entendia
"filosofia" como "fiz a Sofia", "poesia" como
"pó e azia" e "caramelo" como "carro belo",
acabei abolindo esta possibilidade.
Após
um chamado de um colega, meu monitor com mau contato ter ficado rosa, algumas
olhadas no celular, um gole de café frio, dois espirros e um ataque pela flanco
guarda das minhas lombrigas, acho melhor parar por aqui esse texto. Mesmo com o
gato da minha xícara me encarando, com os rabiscos da geografia explicada de
Porto Alegre e o olhar que procura saber como está o clima lá fora. Aos poucos,
vou vencendo a procrastinação. Afinal, como escreveu Lao-Tsé, "uma longa
caminhada começa com o primeiro passo". Ou um texto sempre começa com a
primeira palavra.
Cristian Ribas
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