quarta-feira, 21 de novembro de 2018

A Música Perdida (Crônica)


Caminhando pela sala, entre afazeres pendentes e sentimentos presentes, uma melodia doce e antiga despertou da minha alma e pairou repetidamente na minha cabeça, sendo balbuciada pelos meus lábios. Enquanto o relógio perdia a hora, eu voltava no tempo repentinamente. Voltei a ser um mero adolescente, de olhos luminosos e coração puro, que achava que o futuro seria mais simples em suas lições.
Ao me deparar com a melodia na cabeça, lembrei imediatamente da cena: meu primo, dois anos mais velho, ao receber minha visita, estava ouvindo uma fita cassete que havia recebido de um amigo. Naquele momento, eu ainda não tinha sido capturado pela energia e questionamentos do rock, vagando sem ter um paradeiro certo nos ritmos que embalariam minha trilha sonora. Questionei e meu primo contou que seu amigo era fã de um velho roqueiro canadense. Escutei aquela mistura de violões, gaita de boca e violino tão melodicamente sincronizados. Me senti viajante na voz aguda de Neil Young.
Enquanto eu mergulhava nas profundezas do rock, meu olhar se perdia nas rotações da fita Basf cromo de 60 minutos, fechando os olhos e balançando instintivamente a cabeça, me levando sem questionamentos no embalo das canções. De repente, uma música em especial fascinou meus sentidos. Obrigatoriamente, apertei no pause e voltei a fita, manuseando os botões e procurando o início da música. Fui hipnotizado. No final, pause, volta a fita e toco de novo. Uma, duas, três, infinitas vezes. Do início da tarde até chegar a noite. Me encontrei numa canção. Uma poesia lírica que embalava meus delírios juvenis.
Um tempinho passou, consegui um violão emprestado e aprendi sozinho a tocar o instrumento. Um sonho de infância que era barrado nos traumas de minha mãe que preferia me dar relógios pra evitar que eu fosse músico como meu pai. Na solidão de meu quarto e na criatividade dos meus questionamentos de adolescente, uma de minhas primeiras composições foi instintivamente uma versão daquela canção de Neil Young que eu não sabia o nome.
Hoje, numa tarde em que o universo parecia arredio e este velho coração batia sob intempéries, a canção perdida voltou pra apaziguar meu coração. Abri o youtube e vasculhei as canções de Neil Young. Quando parecia tudo perdido e a desistência se aprochegava sem reverência, a música me encontrou. Ouvi aquele solo de violino e, entre um sorriso largo pela conquista, uma lágrima escapou sem permissão. É “Comes a Time” o nome dela. E a escutei até anoitecer sem precisar apertar o pause no meu celular. Apenas dancei na solidão de meu coração adolescente.

Cristian Ribas

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