segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

O Abraço (poema)




Você conhece
o valor de um abraço?
É um laço
mais forte que aço
e que nos une
de um jeito tão sublime,
que parece
que todos os declives
te jogam em meus braços.
Eu me faço de desentendido,
que não é comigo,
mas meus desejos
nada escondidos
viram abrigo
do teu corpo.
É um jeito absorto
de ignorar o tempo
e onde todos os eventos
passam despercebidos.
Não precisa de motivos
pra puxar quem se gosta
pra dançar 
sem canção.
É meu sorriso distraído
perdido em teu infinito
e achando a razão
em seu íntimo.
Então, fique comigo
enquanto brincamos 
de amor,
seja o tempo que for
pra isso durar.

Cristian Ribas

sábado, 23 de janeiro de 2016

TUA DANÇA



Não consigo descrever tua dança.
Ela flutua
além da minha compreensão,
tão mansa
em minha solidão,
que a esperança
da minha percepção
é que a canção
nunca termine.
Apenas sigo teus passos,
em meu tango calado
admirando a cada segundo,
a sutileza de suas mãos
e como meu coração
baila em sua coreografia.
Acho que é sintonia,
na sinfonia de movimentos
que fazem o tempo
parar.
É a melodia do desejo
que reflete no espelho
o que minha alma
cobiça.
É a fresta do vestido,
as curvas do teu corpo,
as marcas da libido
a loucura de um gemido
que me faz congelar.
Pois o meu lugar
é na tua plateia,
testemunhando a odisseia
de sua simetria.
É tua dança
em minha vida
descrevendo sem palavras
a mais pura poesia.

Cristian Ribas

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Un Recuerdo en Madero





  Ela estava só. Caminhava pelos Bosques de Palermo na companhia da brisa de outono, que trazia a despedida do verão e a introspecção do inverno. No seu espírito, buscava a liberdade, um aguardado encontro consigo mesma, sempre adiado pela inexorável rotina. Entre os pombos e suas sementes, os pássaros e seus cânticos harmônicos, observava cada detalhe com um olhar deslumbrante, vívido, reluzente. Apenas deixava seus pés lhe guiarem sem destino pela manhã pálida, onde as nuvens desenham de cinza o infinito. Nada comparado com o brilho intenso de seus olhos.
   Ao deslocar-se ao sul da cidade, deixou sua visão mergulhar nas águas turvas do Rio da Prata. O movimento no porto, o lento deslize dos navios, as ansiosas chegadas e as dolorosas partidas. Viu-se num tango imaginário, de melodia intensa, apaixonada e triste, onde os olhares se encontram e os corações se perdem. Onde os corpos se unem e o etéreo se funde. Onde a pele arrepia e o desejo ecoa. E o silêncio ensurdecedor de seu íntimo, deixa a saudade sólida no vazio de sua mão. 
   Para aquecer, sentou-se no Café San Juan. Segurou a xícara com as duas mãos para afastar o frio de fim de tarde e pediu um queso y dulce para acompanhar. Observava a parede com fotos de Gardel, os livros de Piglia, Borges e Cortázar na estante, e o poster do River Plate de 1986. Mas, seus olhos refletiam seu interior. Seu coração pulsava freneticamente a cada gole do líquido quente. E sua mente a transportava ao dia anterior da partida, das palavras não ditas, dos sentimentos submersos e do abraço que não queria que terminasse. Podia sentir seu cheiro amadeirado naquele restaurante, como uma essência vívida de sua presença. E no reflexo da vitrine, tinha nítida impressão de vê-lo entrando por aquela porta...

Cristian Ribas      

QUANDO PARIS CHEGAR

         



   Gosto de me sentar aqui. Abrir os olhos em transe, derramar a água sobre o rosto, alcançar o primeiro casaco atirado sobre o sofá, enrolar um cachecol no pescoço e ir despertando a cada passo que a rua me reserva. Ser parte do cinza do céu nublado de janeiro e esconder as mãos no bolso pra não ser vitimado pelo frio.  Flutuo pela neblina com minha mente adormecida, onde formas, palavras e fórmulas não fazem muito sentido. Sou apenas um ser levitando enquanto seu Deus acorda com o pé esquerdo num universo perdido.
   Mesmo que o dia sem formalidade tenha começado, dou-me o direito de ignorá-lo enquanto meu percurso não se torna completo. Ao abrir a porta do café L'Atome, Antoine me recebe com seu "bonjour" carregado e a mesa das minhas teorias e histórias infinitas com o lugar reservado. Sento esperando meu expresso sem pressa, folheando desinteressadamente as páginas do Le Monde e ignorando com meu olhar blazé a importância da taxa de juros, um bombardeio na Síria ou a chegada de imigrantes. O que interessa aos meus olhos são os transeuntes na Rue Saint Saenz, os sons do Boulevard de Grenelle e a Torre Eiffel surgindo imponente, por detrás dos prédios, perfurando o céu na busca de um raio incandescente do sol esquecido.
   Sem me dar conta, o café fumegante desenha curvas no meu olhar embaçado. Seguro a xícara com as duas mãos sentindo o calor percorrer os dedos. Fecho os olhos deixando o olfato me guiar até as madeleines e elevar meu paladar. O biscoito lentamente dissolve-se na boca, espalhando seu sabor pelas mucosas e intensificando minha felicidade ao misturar-se ao gole de café, colocando todos os meus sentidos em alerta.
   Tentando disfarçar a ansiedade com discrição, retiro o relógio do bolso e observo a hora com frágil desinteresse. Ao ouvir a porta da cafeteria abrindo-se, tento conter o sorriso que desenha-se no canto dos lábios. Pelo espelho do fundo do bar, admiro a mulher que entra sempre todos os dias no mesmo horário. Com cabelos longos, negros como a noite infinita, seu sotaque italiano, meu coração pulsa em sincronia ao som de seus sapatos no solo. Sinto o seu perfume me alcançar, como um encanto abrupto que rapta todos os pensamentos. Ecoa na minha mente, tão somente, sua respiração. A forma como seu sorriso agradece o chá inglês servido por Antoine. Como cada gole desce purificando sua alma. E como seu olhar busca o mesmo horizonte que admiro pela vidraça.
    Mesmo em jejum, deixa suas moedas sobre a mesa e segue ao encontro do longo dia que a aguarda. E eu aqui, em minha silenciosa admiração, agradeço por vê-la e por deixar em mim a magia de seu encantamento.  Não imagina o bem que ela me faz. Ou sabe, e entre as agruras das obrigações, carrega consigo o amor. E assim como eu, segue seu destino, no anseio pelas vielas, praças e cânticos, e de quando Paris, com sua magia, chegará em nossos corações.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Cabelo Branco

 


   Sabia que ele chegaria. Um fio de cabelo branco, ilhado pela imensidão da negritude de meus pelos. Um intruso, aliado do tempo e carregando em si todas as razões para chegar, ficar e, aos poucos, deixar seu legado e iniciar um novo ciclo.
   Confesso que ele parecia distante, como um número que não pertencia ao meu cotidiano, mas sim, descrevia a realidade de outros ao meu redor. Eu via indícios,  quando percebia que minhas músicas favoritas tem mais de duas décadas, que as rugas escrevem sua história no rosto de minha mãe, e minha amada irmã, que carreguei no colo, me deu uma linda sobrinha. Me dei conta ao recordar tantos insucessos que forjaram minha alma. Pessoas que deixaram seu amor, levaram o meu e seguiram seu caminho. Tantas lições que teimosamente ignorei e alguns momentos em que o êxito abençoou meu esforço. Sonhos intensos e breves que se dissolveram, e outros, tão fortes e impulsivos, que ainda norteiam meus gestos. 
   Imaginava, na minha longínqua inocência juvenil, que os cabelos brancos me trariam a mesma sabedoria que eu admirava em meus antepassados, me dariam aquele olhar que sempre aponta o caminho mais tranqüilo pra quem amamos e a paciência pra ouvir e definir qualquer dúvida com a palavra certa. Defronte meus atos e os pensamentos que permeiam minhas divagações, me deparo com minha tolice e incertezas. Mas com uma fé inabalável.
   Benvindo, cabelo branco, com todo o significado de sua existência, e dos novos desafios que se formarão por essa estrada. Estarei com o peito aberto, pernas fortes e sorriso bobo, saboreando cada segundo. De seus amores, glórias, histórias decepções, lições, quedas, e a eterna busca da compreensão. Pois nada será em vão. Serão necessários pra nossa evolução. 

By Cristian Ribas