quinta-feira, 11 de maio de 2017

Eu Vou Morrer






   Esses dias, via whatsapp, compartilhei um vídeo antigo do Sílvio Santos caindo dentro de um tanque d'água. A forma como ele riu, brincou, transbordou de alegria, sagacidade e carisma, naquele instante, fez com que as gargalhadas fossem inúmeras comigo e com quem recebeu. E entre tantos debates de admiração a Senor Abravanel, surgiu a seguinte indagação: como será a comoção do país quando Silvio Santos morrer? Realmente, inimaginável. E, de alguma forma, uma sutil amargura aterrizou em meus sentidos, com aquele sentimento de que, algumas pessoas, em sua genialidade, deveriam se perpetuar. O fim do Programa do Jô, Eric Clapton abandonando as turnês, Kobe Bryant sem arremessar a bola alaranjada vestindo dourado e púrpura, Han Solo sendo assassinado por um projeto de vilão ou saber que não haverá nenhuma nova história sendo delirantemente contada por Ariano Suassuna e Gabriel Garcia Marquez. E, repentinamente, uma verdade absoluta e inexpugnável lançou-se em meus olhos, de forma tão tranquila e suave, que apenas me entreguei à resignação: eu vou morrer.
     De algum modo, com a pseudo sabedoria da idade e o olhar nostálgico que, volta e meia, nos visita sem ser convidada, compreendemos subliminarmente que morremos pouco a pouco a cada dia. A cada nova tecnologia que substitui o antigo. A cada vez que nos mudamos de residência ou cidade. A cada situação que nos obriga seguir adiante: o fim da escola, da faculdade, de um relacionamento. Em cada término, algo único, inigualável, irrepetível, se extinguirá, encerrando em nosso íntimo um ciclo, uma fase, apagando uma luz que iluminava a nossa alma. 
    Confesso que já tive muitas mortes. Tantos prazeres e amores, melodias e sabores, palavras e odores, que a memória se perde em sua própria história. E, no meio disso tudo, o tempo nos ensina que a vida é a arte de saber lidar com as perdas. E no meio de cada tormento, involuntariamente, nos tornamos renascimento. O destino nos impõe sua soberana sabedoria em detrimento de nossa ridícula vaidade, nos puxa pelo braço de nossas próprias sombras e nos ilumina novamente. Com novos sorrisos, palavras, abraços e canções.
   Tenho minhas paixões. Os gatos pela sala. O violão com suas cordas enferrujadas. Os livros na estante empoeirada. As camisas de futebol espalhadas. E na imensidão do meu universo, entre mortes e renascimentos, resisto no instinto da minha essência. Enquanto minhas pernas aguentarem, chutarei uma bola. Enquanto meus pensamentos fluírem, serei poesia. Enquanto meus braços se ritmarem, tocarei minhas músicas. Enquanto eu puder amar uma mulher, em todas as suas formas, será tão íntimo, forte e intenso, como se fosse a última. Mesmo compondo o que ninguém ouve. Mesmo escrevendo o que ninguém lê. Mesmo filosofando o que ninguém entende, ainda serei paixão.
   Então, eu sei que vou morrer. Mas, até isso acontecer, sei que haverá muita vida pela frente e muita gente pra eu tocar o coração. 

      
     Cristian Ribas

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