quarta-feira, 9 de julho de 2014

7x1 - O Maior Legado da Copa: A Vitória do Planejamento sobre o Ufanismo

Uma das vantagens de "envelhecer", é ter a noção exata de quando se está presenciando a história. De saber que, aquilo que estamos vivenciando, ficará eternizado na nossa retina, mente e corações. Seja como algo grandioso, majestoso, magnífico. Ou, como catástrofe, tragédia, ferida. 
Ontem, a frase que mais pronunciei foi: "estamos presenciando a história". Será um daqueles acontecimentos que, sempre que nos perguntarem, nós lembraremos bem onde estávamos e o que fazíamos. Como, por exemplo, a morte do Senna, a queda das Torres Gêmeas ou a Batalha dos Aflitos. A partir de hoje, até o resto de nossos dias, ouviremos a pergunta: o que aconteceu?

Precisamos ter um pouco de Alemanha dentro de nós.


Antes de ser brasileiro, gaúcho e gremista (não necessariamente nessa ordem), sou um apaixonado por futebol. E sou fã incondicional da Bundesliga (Liga Alemã) desde 1992, quando a TV Cultura começou a transmitir seus jogos. Eu vi, em dezembro de 1992, o amistoso entre Brasil 3x1 Alemanha no Beira Rio, encantado com a seleção germânica: Matthäus, Völler, Klinsmann, Hassler, Augenthaler, entre outros. Tenho a camisa 10 da conquista de 1990, a mais bela de todas. E posso, em uma única frase o que aconteceu: a vitória do planejamento sobre o ufanismo. E provarei isso contando uma historinha.

Na Eurocopa de 2000, na Holanda e Bélgica, a Alemanha foi eliminada na fase de grupos. Baseada nisso, a Federação Alemã de Futebol (Deutcher Fussbal Bund) viu que seu estilo germânico de jogo, pragmático, baseado na força, altura e imposição física, estava defasado. Algo novo tinha que ser criado. Foi o surgimento de um novo conceito e metodologia.

Desde então, todos os times da primeira e da segunda divisão são obrigados a construir um centro de excelência para jovens. O segundo passo foi criar critérios para avaliar essas academias sob o ponto de vista de infraestrutura - campos, vestiário, equipamentos técnicos- e de pessoal -exames para técnicos, psicólogos e preparadores físicos. Com isso, o investimento dos clubes crescia a cada ano em suas divisões de base. De início, os times investiam R$ 125 milhões por ano, número que praticamente dobrou depois de 12 anos. No total, clubes da primeira e segunda divisão já gastaram R$ 1,4 bilhão com infraestrutura e pessoal para a formação de atletas.

Em paralelo ao trabalho da liga, a DFB instalou 366 centro de treinamentos de excelência pelo país, em associações com escolas, que atendem garotos de 10 a 14 anos. São verdadeiras escolas de futebol em que é feito um treinamento individualizado para cada jovem atleta. Cerca de 14 mil jovens são atendidos por essas escolas. Depois dos 14 anos, eles podem ter acesso às academias dos clubes.
O programa tem como objetivo incentivar a prática do futebol, mas também tem a intenção de que isso seja feito em paralelo com a formação escolar. A DFB, por exemplo, tem uma estatística que demonstra qual o percentual de seus jovens jogadores que se dedicam prioritariamente à gramática ou a ciências exatas. Há também psicólogos para acompanhar os garotos e organizar suas tarefas de forma que não exista prejuízo à escola por conta da atividade do futebol. Assim, boa parte dos atletas que se tornam profissionais também conseguem ir para a universidade.
Com exceção do veterano Miroslav Klose, todos os 23 convocados pelo técnico Joachim Löw passaram por esses centros de excelência, que ajudaram a formar a que, para muitos, é uma das melhores gerações da história recente do futebol alemão.
Também podemos lembrar a preparação da seleção alemã. Ao chegar aqui, a DFB não encontrou nenhum local com a estrutura desejada. O que fizeram? Construiram um centro de treinamentos em Santa Cruz Cabrália, para adaptação ao clima do nordeste, onde teriam a maioria dos jogos da primeira fase da Copa. Enquanto os técnicos da Inglaterra, Itália e Espanha reclamavam do calor, os alemães treinavam na Bahia às 13h, devido o horário dos jogos.
Ah, antes que me esqueça, a Alemanha, no último amistoso da Copa, perdeu seu principal atacante, Marco Reus, do Borussia Dortmund. Alguém sentiu falta?
A Alemanha vem num processo de amadurecimento e resultados. Terceiro em 2006, em casa, muito comemorado. Vice na Euro 2008. Terceiro na Copa de 2010. E Terceiro na Euro 2012. E agora, o que merecem?

E o Brasil? Na apresentação, Carlos Alberto Parreira declarou de pulmão inflado no dia da apresentação da seleção brasileira: "chegou o campeão". Dependíamos única e exclusivamente da genialidade de um garoto de 22 anos. E percebemos, nas penalidades contra o Chile, uma equipe sufocada pela pressão de ter de ser aquilo que esperam, e não, o que realmente é: uma equipe jovem que carece de valores e experiência, carregando o fardo da obrigatoriedade de um título para o qual não nos preparamos. Como entidade (CBF) e como país. 
Aliás, a CBF é um penduricalho político, multimilionária, com a mesma "administração" desde 1989, sem nenhuma preocupação ou ação com as verdadeiras carências do futebol brasileiro. E tão cedo, não mudará.
Pra encerrar, deixo um texto do Técnico Sidney Moraes, do Náutico/PE, lido pelo apresentador Milton Neves ontem à noite em seu programa. 

“Isso representa mais que um simples jogo! Representa a vitória da competência sobre a malandragem! Serve de exemplo para gerações de crianças que saberão que pra vencer na vida tem-se que ralar, treinar, estudar! Acabar com essa história de jeitinho malandro do brasileiro, que ganha jogo com seu gingado, ganha dinheiro sem ser suado, vira presidente sem ter estudado! O grande legado desta copa é o exemplo para gerações do futuro! Que um país é feito por uma população honesta, trabalhadora, e não por uma população transformada em parasita por um governo que nos ensina a receber o alimento na boca e não a lutar para obtê-lo!  A Alemanha ganha com maestria e merecimento! Que nos sirva de lição! Pátria amada Brasil tem que ser amada todos os dias, no nosso trabalho, no nosso estudo, na nossa honestidade! Amar a pátria em um jogo de futebol e no outro dia roubar o país num ato de corrupção, seja ele qual for, furando uma fila, sonegando impostos, matando, roubando! Que amor à pátria é este! Já chega!!! O Brasil cansou de ser traído por seu próprio povo! Que sirva de lição para que nos agigantemos para construirmos um país melhor! Educar nossos filhos pra uma geração de vergonha! Uma verdadeira nação que se orgulha de seu povo, e não só de seu futebol!!”

É um momento histórico. E espero que sejamos capazes de reconstruir nossos conceitos, com humildade e trabalho. Que o mérito, assim, aparecerá.











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